26/08/2014

Tudo que ainda pode ser

Um dia tive um pai, que vivia dizendo que queria viver sua própria vida, viveu tanto que morreu doente em corpo e alma;
Um dia tive um namorado que vivia dizendo sobre o quanto preferia estar só, ele chorou quando quis partir, e hoje é tão sozinho que se queixou comigo do peso do vazio de não ter ninguém;
Um dia tive uma grande amiga que, dizia que nossa amizade seria para sempre, hoje ela passa por mim e finge não me conhecer;
Um dia tive um irmão, eu me queixava da sua presença irritante e de suas brincadeiras insistentes que maquiavam o amor dele por mim, hoje mal me dirige alguma palavra, e sinto saudade de como eu odiava tê-lo por perto;
Um dia tive uma irmã quase siamesa, fazíamos tudo juntas, e eu queria um quarto só para mim, hoje, sinto falta de dividir meu quarto vazio com ela;
Um dia tive várias ambições, mudar o mundo, revolucionar, ser diferente, lutar pelos mais fracos, hoje reconheço minha fraqueza e luto pra vencer a mim mesma nos momentos de pensamentos tristes;
Um dia tive uma família completa, que brigava por lugar no sofá, controle-remoto, última fatia de lasanha, hoje sobram últimas fatias, espaços no sofá e a televisão vive desligada;
Um dia todos me cumprimentavam e me conheciam, hoje sou uma estranha no ninho;
Um dia as músicas me acompanhavam em todos os momentos, hoje são parte das minhas lembranças;
Um dia sonhei em me formar na faculdade, me formei ano passado e não fui sequer à colação de grau, não tinha ninguém pra me abraçar na hora que recebesse o canudo simbólico do diploma;
Um dia escrevi muitos poemas, hoje releio tudo escrito, e reconheço com um quase nó na garganta, o quanto eu era feliz em excesso e o muito que não valorizei se foi, hoje, temo tanto não valorizar o que tenho, que antecipo a tristeza e a solidão que não vou suportar viver. E bate à minha porta um medo imenso de "tudo que ainda pode ser".