01/12/2013

Carta de um suicida

Nem sei se uma carta com tal conteúdo faria alguma diferença no ato em si, mas todo mundo se já pensou em suicidar, deve ter planejado por dignidade escrever uma carta à altura da sua existência interrompida.

O coração apertado, a respiração pesada e a escuridão iluminando os dias de faz de conta que sou feliz. Acordar durante a madrugada pensando nas frustrações de ter nascido e pegar no sono por causa do peso que estes pensamentos trazem à cabeça.

Caminhar nas estações de trem observando sorrisos vazios e olhares atormentados faz pensar em quão desperdiçante é a vida.

Viver é perder tempo, é conduzir a alma a um rumo vago e cheio de perdas. Vive-se só para isto, perder e nada mais.
Vive-se acomodado com a falsa promessa de que um dia se será plenamente feliz. 

Lasciate Ogni Speranza.

Os outros parecem felizes, mas não o são, fingem o tempo todo, sorriem por mera convenção social. Todos carregam em si a penumbra da existência. Essa doença incurável que asfixia os dias até carregar-nos no braço forte da morte para viver intensamente a paz eterna. 

Viver? - é uma dádiva fatal (já disse o poeta).

Mais saudável meter uma corda no pescoço e chutar o banco abaixo dos pés.
Mais vitorioso engolir doses exageradas de comprimidos letais.
Mais digno se fechar num comodo e inalar gás.
Mais justo é cortar os pulsos na vertical.

Passamos nesta vida por uma correnteza de tristeza, perdemos entes queridos, perdemos amores, perdemos esperança, dinheiro, saúde, amigos... e por fim, tragicamente, nos perdemos de nós mesmos, pois para sermos reconhecidos devemos nos adaptar à essa sociedade nojenta e agonizante. 

Para viver plenamente é preciso se deixar morrer diariamente. 

E os outros?
estes que balbuciam "eu te amo" em nosso encontro, não passam de mera platéia, expectadores de nossa morte, anseiam o dia em que nos verá rodeados de flores e velas em um caixão de falsa madeira, quando, finalmente, poderão, por remorso entregar-nos as flores que quando ainda vivos nunca nos ofereceram.

Neste dia, chorarão por não ter nos enchido de preces, lágrimas e pedidos de "fica" ou "volta, por favor", porque a perda eterna desperta beleza, poesia e mistério ao amor enterrado em vida.

Para amar eternamente é necessário observar o objeto amado entre quatro velas, ou visitar uma lápide abandonada até por urubus num vazio e cinza cemitério.

Se ainda tem os que ama por perto, dê lhes flores, chocolates, doces palavras e amor, o amanhã é o adeus, o fim vertiginoso da inexistência chacoalhando pensamentos egoístas que após o partir eterno serão obrigados a amar a fraude que foi a vida. 




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